Preço das casas • ESPECIAL HABITAÇÃO
10 Novembro 2023
Este texto é o primeiro de uma série de 7 artigos do ESPECIAL HABITAÇÃO que será publicada semanalmente até ao Natal.
Este é provavelmente o relatório mais exaustivo alguma vez publicado sobre a evolução dos preços das casas em Portugal. Que lhe vai permitir observar a evolução do valor/m2 que vem pagando por uma casa em Lisboa, Porto, suas respetivas áreas metropolitanas, e no resto do país, nos últimos 5 anos.
As tabelas apresentadas permitem-lhe confirmar por si mesmo os valores (e a nota metodológica final explica porque estes são os mais exaustivos e fiáveis disponíveis sobre os preços da habitação em Portugal), e entender onde efetivamente os preços mais subiram, e onde e quando desceram.
Nesta artigo vou falar, com exemplos concretos, de como as acessibilidades e infraestruturas, uma pandemia, a procura estrangeira ou opções políticas, impactam a valorização do parque habitacional.
CONCELHOS DA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA
Por moedas1.
1T 2018 – 1T 2020
1T 2020 – 1T 2022
1T 2022 – 2T 2023
As tabelas 1.1, 1.2 e 1.3 exibem de forma detalhada a evolução da mediana do valor/m2 das vendas de habitações nos 18 municípios da Área Metropolitana de Lisboa (AML).
Sendo que Lisboa, Cascais e Oeiras são os três concelhos de todo o país onde os preços das casas são mais elevados.
As conclusões mais óbvias são:
1) há uma valorização consistente das habitações nesta região;
2) no último ano, com a exceção de Alcochete e Mafra, os preços registados acumularam recordes sucessivos, ou seja, a cada trimestre que passa, um novo valor máximo vem sendo atingido.
A VALORIZAÇÃO DO PERÍMETRO DA CIDADE
No período pré-pandémico (1T 2018 – 1T2020) Lisboa regista ainda uma valorização muito significativa: 29,1%. Mas foi o concelho da Amadora que bateu todos os recordes de valorização, ao registar um crescimento de 47.0%.
A contiguidade a Lisboa e, muito provavelmente, a extensão da linha azul do Metro (a estação da Reboleira, na Amadora, havia sido inaugurada em 2016), fizeram deste concelho uma alternativa funcional para quem já não pudesse pagar os preços de Lisboa, mas não quisesse abdicar de aceder rapidamente ao centro da capital: segundo o Google Maps vai-se da Reboleira ao Marquês de Pombal em apenas 19 minutos.
No período entre 1T 2020 e 1T2022, que pode e deve ser associado às restrições e condicionamentos registados por via da Covid 19, a valorização das casas em Lisboa contrai para 9,3%, chegando-se a verificar descidas trimestrais.
No mesmo intervalo temporal a valorização na Amadora cai para 20,5%, e o abrandamento do ritmo de valorização faz-se sentir em 13 dos 18 municípios.
ONDE SUBIRAM OS PREÇOS DURANTE A PANDEMIA?
Quando analisamos os dados do portal Pordata damo-nos conta de que os 5 concelhos onde a valorização entre 1T 2020 e 1T 2022 foi superior ao crescimento dos preços nos dois anos imediatamente anteriores, são também aqueles que apresentam menor densidade populacional.
Em Alcochete e Palmela vivem 150 habitantes por Km2. Em Mafra, Sesimbra e Vila Franca de Xira esse mesmo rácio varia entre os 250 e os 450 habitantes por Km2.
Tem uma ideia sobre a densidade populacional nos concelhos de Lisboa, Amadora ou Odivelas? Está entre os 5.000 e os 7.500 habitantes por Km2.
Neste período os preços tenderam a crescer mais em zonas menos densas da AML. O que vai ao encontro da ideia que o senso-comum tanto produziu durante a pandemia: mais do que nunca, as pessoas demonstraram disponibilidade para trocar centralidade por espaço.
5 ANOS DEPOIS, O DOBRO DO PREÇO
No último ano a valorização do preço das casas tem-se mantido consistente. Mas parece haver uma relação de inversa proporcionalidade entre o valor das casas num dado município e o seu ritmo de valorização.
Ou seja, quanto mais baixo é o preço das casas num dado local, maior parece ser a margem para a sua subida. O que é coerente com a ideia de que a crista da valorização das casas em Portugal começou no centro de Lisboa (e depois no Porto) e se expandiu para a sua periferia.
Por fim, analisando a evolução dos preços em todo o período em análise (entre 1T 2018 e 2T 2023), não pode deixar de se assinalar que nos municípios de Sintra, Seixal, Setúbal, Barreiro e Palmela, o preço das casas superou os 100% de valorização.
Ou seja, mais que duplicou.
FREGUESIAS DO CONCELHO DE LISBOA
Por Sebastio.
1T 2018 – 1T 2020
1T 2020 – 1T 2022
1T 2022 – 2T 2023
Antes de tudo gostaria de sublinhar que, aquilo que a análise destas tabelas torna mais evidente, é que se deve ter cautela quando se fala de Lisboa de uma forma homogénea. As suas 24 freguesias e os seus 100km2 de área representam um território heterogéneo com dinâmicas muito diversas.
A PANDEMIA, A MOBILIDADE, O ARRENDAMENTO E O ALOJAMENTO LOCAL
Em segundo lugar, gostaria de lembrar que, de forma geral, o período pandémico penalizou significativamente a evolução dos preços na capital. O que, no meu entender, é justificado parcialmente pela dificuldade ou incapacidade que, em alguns momentos, os residentes em outros países enfrentaram para poder chegar ou estabelecer-se em território nacional.
É importante lembrar que o efeito da pressão de cidadãos estrangeiros sobre os preços das casas não se dá estritamente por via da compra de um imóvel. Se esta demanda tem um efeito no valor das rendas praticadas na cidade, ela impactará também o valor de mercado de uma casa que, em última análise, é expresso por um múltiplo das rendas que aquele imóvel é capaz de gerar.
Por outro lado, talvez já não se recorde mas, durante o estado de emergência, o Governo impossibilitou o cancelamento dos contratos de arrendamento por falta de pagamento das rendas. Ou seja, independentemente de se concordar ou discordar com a medida (e devemos lembrar-nos que o contexto foi provavelmente o mais atípico das nossas vidas), a verdade é que a ação política deixou os senhorios à mercê dos inquilinos.
De que nos serve consultar os dados oficiais sobre os valores dos novos arrendamentos na altura (e em 1T 2021 Lisboa e Porto registaram descidas homólogas nos valores das rendas), quando sabemos que naquele período houve senhorios que aceitaram baixar rendas, e outros que as deixaram de receber? O que não podemos é esquecer o contributo deste contexto quando olhamos para a Tabela 2.2 e vemos os valores a vermelho, a assinalar baixas de preço face aos trimestres anteriores.
Outra evidência: os preços nas freguesias da Misericórdia e Santa Maria Maior e Misericórdia desceram no período pandémico. E aqui, há também um duplo efeito. Esta duas freguesias englobam geograficamente algumas das áreas mais turísticas das cidades. Pelo que é normal que os arrendamentos de curta e média duração que ali proliferam, tenham caído em número e valor, penalizando o rendimento expetável que aqueles imóveis pudessem gerar.
O que não faltavam naquela altura no Idealista eram apartamentos em zonas centrais da cidade, anunciados por preços atrativos, por períodos inferiores a um ano; na esperança de que, no Verão seguinte, a evolução da pandemia já voltasse a permitir rentabilidades elevadas em formatos de curta duração.
Em cima disso são duas freguesias que compreendem bairros sobre os quais incidiram, desde o início, restrições ao Alojamento Local (AL): as chamadas “zonas de contenção”.
O que aconteceu nestas zonas?
- Os novos pedidos de licença para unidades AL deixaram de ser aceites;
- A venda de um imóvel com uma licença válida implica a caducidade da mesma, impossibilitando a replicação da atividade anterior e respetiva rentabilidade, penalizando o valor comercial do imóvel.
As primeiras duas zonas de contenção foram implementadas em Novembro de 2018 e afetaram ambas as freguesias. Mas um ano depois estas restrições foram ampliadas e deixaram praticamente toda a freguesias de Santa Maria Maior excluída de novas licenças de AL. Dito isto, segundo a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e os últimos Census de 2021, em Santa Maria Maior e Misericórdia o rácio de imóveis dedicados ao AL face "Alojamentos Familiares Clássicos" eram de 71,3% e 47,4%.
Ou seja, em cada uma destas freguesias, por cada 10 casas onde se espera que efetivamente habite alguém a título permanente, existem respetivamente outras 7 e 5 casas dedicadas ao AL. São números muito expressivos que parecem justificar a necessidade que a CML encontrou em aplicar restrições de natureza geográfica às novas licenças de AL.
Mas isto significa também que uma parte muito significativa dos apartamentos daquelas duas freguesias, perderá a sua capacidade de gerar rendimento no momento em que for vendida (por via da extinção da licença AL, e impossibilidade de replicar o modelo de negócio atual). O que nos diz também que o valor pelo qual essa venda deverá acontecer, será necessariamente inferior ao preço que alguém estaria disposto a pagar por aqueles imóveis caso não houvesse restrições à sua exploração.
E AGORA?
Quando se observa os últimos trimestres do período em análise percebe-se que os preços das casas em Lisboa parecem recuperar ritmo de valorização. Os números registados entre 1T 2022 e 2T 2023 não perspetivam a estabilização dos valores da habitação pela qual tantos potenciais compradores parecem ansiar.
A coluna da Tabela 2.3, que nos remete para a evolução de preços entre 1T 2022 e 2T 2023, remete também para o início da Guerra da Ucrânia, da escalada dos preços e das taxas de juro. Ou seja, durante o período em que tanto se falou da quebra do poder de compra e nas dificuldades de acesso ao crédito, vemos 16 das 24 freguesias lisboetas a valorizarem-se, em pouco mais de um ano, entre 10% e 20%.
Não é apenas uma valorização superior à média nacional. É uma valorização muito superior à inflação. Ou seja, mesmo no centro de Lisboa (uma espécie de ponto zero para a valorização mais substantiva das habitações em Portugal, e por esse motivo também, a escolha mais consensual e razoável para quem arrisca falar em fim de ciclo), as casas continuam a valorizar-se de forma substantiva. De registar ainda Benfica e Olivais com valorizações de 21,4% e 24,1% respetivamente.
Por fim, e porque até o mais distraído dos leitores não me perdoaria a omissão, sobre o facto de em menos de 4 anos Marvila ter passado da freguesia mais barata de Lisboa à segunda mais cara; remeto a explicação para este texto do Verão passado, que explica aquilo que “tem Marvila que mais nenhum outro local em Lisboa pode oferecer”.
CONCELHOS DA ÁREA METROPOLITANA DO PORTO
Por Pedro Menezes.
1T 2018 – 1T 2020
1T 2020 – 1T 2022
1T 2022 – 2T 2023
CONCENTRAÇÃO DAS MAIORES VALORIZAÇÕES EM TORNO DA CIDADE DO PORTO
Se analisarmos a Tabela 3.3, onde podemos observar a valorização da mediana do valor/m2 dos preços a que as casas foram vendidas ao longo de todo o período em análise, damo-nos conta que ao contrário do que acontece na região de Lisboa (onde os preços duplicaram essencialmente em municípios mais periféricos daquela área metropolitana), as maiores valorizações ocorreram precisamente em 3 dos 4 concelhos que partilham limites geográficos com o Porto: Matosinhos, Vila Nova de Gaia e Gondomar.
Ao que se deve acrescentar que, é precisamente nos quatro municípios onde os preços são mais baixos, que a valorização é menos consistente nos últimos trimestres. Inclusive Arouca apresenta uma evolução marginalmente negativa (se lá for – e sugiro que vá, os Passadiços do Paiva são incríveis – vai percecionar uma zona rural, e não metropolitana).
Este dado demonstra que, tendo a valorização das casas e o investimento imobiliário se expandido do centro das duas maiores cidades portuguesas para a sua periferia, há necessidade de assinalar que a Norte, a pujança desse efeito cascata é mais limitada no espaço.
Uma nota interessante: (segundo o Confidencial Imobiliário, um banco de dados especializado no segmento residencial) Vila Nova de Gaia poderá ser o concelho com maior número de casas em pipeline em todo o país. Isto porque em 2022 foram submetidos a licenciamento municipal em Portugal Continental um total de 19.500 novos projetos de habitação que somam 43.800 fogos distribuídos por 278 concelhos. Sendo Gaia responsável pelo maior número de destes fogos (2.800). Porto por 1.650 e Matosinhos por um valor inferior a 1.500 fogos (Lisboa com 2.120 fogos, Braga, Oeiras e Guimarães são os outros concelhos com mais de um milhar de unidades em produção).
FREGUESIAS DO CONCELHO DO PORTO
Por Rh2010.
1T 2018 – 1T 2020
1T 2020 – 1T 2022
1T 2022 – 2T 2023
A evolução dos preços na cidade do Porto continua consistente. Ainda que, pela estrita análise dos últimos trimestres, já não pareça oferecer uma maior margem de valorização que Lisboa. Mas pessoalmente, acredito que o que estará para acontecer em Campanhã, poderá dinamizar ainda mais a zona Este da cidade.
A REABILITAÇÃO URBANA E O SEU LEGADO
Na União de Freguesias (UF) de Aldoar Foz do Douro e Nevogilde (que como o nome sugere, inclui a famosa zona da Foz), no centro histórico do Porto (UF de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória), e na UF de Lordelo e Massarelos (que compreende o Bairro Gomes da Costa, Serralves, Campo Alegre, Bom Sucesso, Galiza, e grande parte da faixa ribeirinha que há entre a Foz e Miragaia) continuam a verificar-se valorizações consistentes. Mas o grosso da reabilitação urbana, depois do boom no centro histórico, parece acontecer em Bonfim e Campanhã.
Foi precisamente nestas duas freguesias que os valores dispararam nos últimos 5 anos.
Isto aconteceu porque à medida que os preços na zona histórica cresciam, o interesse pelas vizinhanças a Este (no sentido contrário à foz do Rio Douro) foi aumentando. Afinal de contas... quantas recantos para os lados do Passeio de São Lázaro ou Campo 24 de Agosto, consensualmente descritos como decadentes há menos de 10 anos, não passaram a ser presença assídua na revista Time Out?
Por último, uma palavra parao Metrobus, um novo meio de transporte que, segundo o Metro do Porto, "combina a eficácia, pontualidade e fiabilidade já conhecidas do Metro com a flexibilidade e o conforto da última geração do autocarro ecológico, alimentado a hidrogénio", e tem "prioridade sobre todos os outros modos de transporte (através de um sistema de semaforização inteligente"). O seu primeiro troço deverá estar disponível no Verão de 2024, e assegurará o transporte entre a Casa da Música, Serralves, e a Praça do Império.
CONCELHOS DAS CAPITAIS DE DISTRITO E DAS SEDES DOS GOVERNOS REGIONAIS DOS AÇORES E DA MADEIRA
Por mlehmann78.
1T 2018 – 1T 2020
1T 2020 – 1T 2022
1T 2022 – 2T 2023
A análise da evolução dos preços da habitação em Portugal tem sido feita, essencialmente, em torno das duas áreas metropolitanas por estas representarem, em conjunto, 45% da população nacional.
Mas achei que era importante falar sobre o que acontece no resto do país, até porque há muito que Lisboa e Porto deixaram de ser os únicos sítios a atrair novos habitantes, sejam eles nacionais ou estrangeiros.
O TOP 10 NACIONAL
Sabe em quantos concelhos a mediana do valor/m2 pelo qual as casas são vendidas ultrapassa os 2.500€? 10.
Quer saber quais são? Por ordem decrescente: Lisboa, Cascais, Oeiras, Loulé, Lagos, Vila do Bispo, Aljezur, Porto, Albufeira, Tavira.
Será que o valor/m2 é mais elevado em Sagres que na Avenida da Boavista, no Porto? Por mais que surpreendente que possa parecer, à luz destes números (os mais fidedignos que é possível obter em Portugal; ver nota metodológica final), descobrimos que aparentemente isso será possível.
A verdade é que 6 dos 10 municípios mais caros para comprar casa em Portugal são no Algarve.
UMA PEQUENA VILA À BEIRA-MAR PLANTADA
A Nazaré é, mesmo sem ignorar o impacto do turismo, das suas ondas gigantes e daqueles se atrevem a surfá-las, a grande surpresa desta análise nacional sobre a evolução dos preços da habitação. Num total de 308 concelhos em todo o país, esta vila dá nome ao 23º município mais caro de Portugal, com 2.065€/m2 (mais 55% que Leiria, a sua capital de distrito).
Decidi investigar um pouco mais: a mediana do valor/m2 do preço de habitações naquele concelho subiu 24,8% no último ano (semelhante à evolução dos preços na Amadora nos dois anos que precederam a pandemia).
E apenas no último trimestre, os valores da habitação cresceram 12,2%. Só para ter noção, isto é mais que a valorização média das casas em todo o país no espaço de um ano.
Por Hugo Amaral.
LITORAL VS. INTERIOR: O GRANDE CONSTRASTE NACIONAL
A Nazaré é apenas uma caricatura pitoresca de uma realidade que há muito é conhecida. Se dividirmos ao meio a Tabela 5.3 damo-nos conta que, entre as 10 capitais com o preço do solo mais elevado encontramos apenas 3 que não são banhadas pelo mar ou por um estuário: Évora (cidade com uma profunda tradição turística), Coimbra (paragem obrigatória de qualquer comboio que circule entre Lisboa e Porto, e sede da mais antiga universidade do país), e Braga (o maior centro urbano fora das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto).
Dizer isto não é mais que recordar aquilo que a maioria das crianças de 10 anos já terá aprendido na escola: em Portugal os contrastes mais fortes acontecem entre interior e litoral.
É no litoral que o preço do solo é mais elevado. Desde logo porque estas áreas geográficas tendem, quase sempre, a registar uma maior pressão populacional (a demografia é frequentemente esquecida, mas é também o fator com mais impacto na valorização do edificado residencial). E não será uma coincidência que Portalegre, a capital de distrito com o valor/m2 mais baixo de todo o país, seja também segundo os Censos 2021, a capital de distrito com menos população, e aquela que mais habitantes perdeu nos dez anos anteriores.
AS UNIVERSIDADES E OS PREÇOS DAS CASAS
Portugal tem 13 universidades públicas. Das 10 cidades que ocupam a primeira metade destas tabelas, apenas Setúbal não é sede de uma universidade. Por outro lado, das 10 cidades que ocupam a segunda metade das tabelas apenas uma, Vila Real, é sede da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Ainda assim, importa referir que todas estas cidades sem exceção albergam institutos politécnicos.
A presença de uma Universidade numa capital de distrito tem a capacidade de dar a conhecer uma cidade e uma região a alunos provenientes de outras partes do país (e de outros países). Contribui para dinamizar a economia local e, necessariamente, tem um impacto não apenas na procura, mas até na definição da oferta do sector residencial, que expetavelmente se adaptará ao facto de milhares de alunos procurarem ali um espaço para dormir durante o ano letivo.
Isto significa que, por exemplo, as rendas na cidade de Aveiro não seriam tão altas se não houvesse ali uma Universidade. E que o aumento desse rendimento potencial, influencia também o valor pelo qual uma casa poderá ser vendida.
Aliás, se há dois subsegmentos sobre os quais parece haver vontade e (boas) razões para se querer investir, eles são precisamente o alojamento de estudantes e, porque a demografia é uma vez mais esclarecedora, as residências para séniores.
CONCLUSÕES
Por malajscy.
O objetivo essencial deste texto foi partilhar os fundamentais das dinâmicas dos preços nos últimos 5 anos, em cada uma destas geografias. Para que, com mais dados e informação, o leitor possa considerar novas variáveis ou dar atenção a outros aspetos. Porque a resposta à pergunta mais famosa de todos os tempos – "O que vai acontecer amanhã?" – não poderá nunca (tentar) ser respondida com base em apenas uma ou duas variáveis.
Mas isso não implica que não recordemos que o pricipal motivo para o abrandamento do lado da procura, está relacionado com a subida da taxa de juros. E que esta subida não foi mais que a resposta dos bancos centrais à inflação. Ainda que se estejam a registar descidas dos seus valores homólogos, no Espaço Euro, e em Portugal. Sendo importante sublinhar que só nos próximos meses deveremos conseguir perceber o quão robusta é esta tendência.
Em todo o caso, pela primeira vez desde Julho passado, o Banco Central Europeu não alterou (subiu) as taxas diretoras.
Ainda sobre a inflação: uma das ocorrências que terá contribuído significativamente para o aumento dos preços foi a guerra na Ucrânia. Por outro lado, não deixa de ser curioso referir que, desde o ano passado, inúmeras famílias ucranianas e russas se mudaram para Portugal. Ou seja, se é verdade que um conflito armado tenderá sempre a impactar negativamente o comportamento da economia, também é verdade que Portugal se tem afigurado como um destino de refúgio. Logo, com mais procura por casas para arrendar (ou eventualmente comprar). Não apenas pela distância a que está do conflito (se fosse um investidor onde se sentiria mais confortável em colocar o seu dinheiro, no Leste europeu ou no mais ocidental dos países?), mas também por a comunidade ucraniana já ser em 2021 (antes do início da guerra) a 7ª maior representação estrangeira em Portugal.
Quanto à oferta, muito estão surpreendidos por, num país em que a vasta maioria das hipotecas é assegurada por taxa variável, não parecer haver mais vendas forçadas pelo contexto. Sobre isto há a assinalar os esforços políticos para aliviar a carga exercida sobre as prestações do crédito: depois da obrigatoriedade de os bancos apresentarem soluções para baixar a prestação, veio a postecipação do pagamento de 30% do valor da Euribor.
Por outro lado, essas vendas poderão estar a acontecer pontualmente, mas ao dia de hoje ninguém terá de passar pelo episódio traumático de “entregar” a casa ao banco. Por um motivo simples: ao contrário do que aconteceu há 10 anos, os preços das casas continuam a subir e não a descer.
Nas próximas seis semanas, vou publicar um texto semanal, onde abordarei cada um dos temas mais discutidos este ano relativos à habitação. Vai ser uma abordagem desprendida de inclinações, enviesamentos, ascendentes ideológicos ou mitologia urbana.
O que lhe prometo não é menos que isto: uma análise objetiva e isenta sobre cada um dos temas mais quentes do mercado imobiliário residencial.
BREVE NOTA METODOLÓGICA
Todos os dados partilhados neste artigo tiveram como fonte as Estatísticas de Preços da Habitação ao nível local do Instituto Nacional de Estatística (INE), que apresentam desde logo três vantagens de natureza metodológica face a qualquer relatório de preços da habitação em Portugal:
1) Reportam-se aos valores reais de transação e à Área Bruta Privativa que consta na Caderneta Predial do imóvel (assegurando assim informação consistente sobre os preços por metro quadrado), informação apenas possível graças ao protocolo existente com Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que possibilita ao INE o acesso à informação de natureza fiscal;
2) Incluem todas as transações de propriedades em Portugal cuja afetação seja "habitação", cuja área bruta privativa seja superior a 20m2;
3) Os resultados divulgados para cada trimestre correspondem à informação registada para o trimestre de referência e para os três trimestres anteriores, o que permite mitigar significativamente eventuais efeitos sazonais no comportamento das vendas (no caso concreto do contexto pandémico, terá sentido considerar que as discrepâncias verificadas nos trimestres em que se verificaram restrições poderão ter sido mais evidentes do que aquilo que os números publicados pelo INE sugerem).
Outros estudos relacionados da autoria do INE
O INE também publica estatísticas sobre a avaliação bancária. Mas é importante recordar que:
a) Parte significativa das casas em Portugal não é comprada com recurso a financiamento;
b) as avaliações bancárias são obtidas, na sua esmagadora maioria, pela análise dos valores anunciados das casas que, muitas vezes, não correspondem necessariamente aos preços praticados.
Estudos produzidos por portais, mediadoras e bancos de dados
Note-se também que, quando estamos perante um estudo feito por um portal imobiliário, os resultados têm como base o preço pedido (que, na grande maioria das vezes, não corresponde ao valor real de transação). É também mais difícil assegurar que as áreas inseridas são as corretas. De resto, acontece com alguma frequência encontrarmos o mesmo imóvel anunciado num mesmo portal, por preços e valores de área distintos.
Por outro lado, se o estudo foi feito por uma marca de mediação imobiliária, ela poderá apresentar valores reais de transação, mas apenas daquelas nas quais teve intervenção direta, o que limitará de forma significativa a abrangência do estudo.
Há ainda bancos de dados que têm acesso aos valores de transação que as empresas de mediação afiliadas lhes comunicam. Mas, em todo o caso, ignoram todas as transações asseguradas por particulares ou empresas de mediação com as quais não tenham relação.
Por estes motivos entendo que valores das Estatísticas de Preços da Habitação ao nível local do INE são aqueles que oferecem um retrato mais exaustivo e representativo de todo o universo dos preços da habitação em Portugal.