Preço das casas
30 Agosto 2021
O QUE VAI ENCONTRAR NESTE ARTIGO?
Os valores trimestrais da mediana dos preços por metro quadrado, registados nos últimos 3 anos de todas as casas transacionadas em:
– cada um dos concelhos das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto;
– cada uma das freguesias das cidades de Lisboa e Porto;
– cada um dos concelhos das capitais de distrito e das sedes dos governos regionais dos Açores e da Madeira.
[no final do texto encontrará uma breve nota metodológica, simples e clara, que explica porque é que os dados partilhados neste artigo são os mais universais e fiáveis sobre o preço das casas em Portugal]
por PeekCC
EVOLUÇÃO DO PREÇO POR METRO QUADRADO (€/m2) DAS CASAS NAS SETE CIDADES PORTUGUESAS COM MAIS DE 100.000 HABITANTES
Atente por favor à legenda que se encontra à direita do gráfico. Vai encontrar a correspondência entre cada linha do gráfico (cidade) e cada uma das cores.
Na legenda vai encontrar também o valor que traduz evolução dos valores medianos por metro quadrado entre o 1º trimestre de 2016 e o 1 trimestre de 2021, em Portugal e em cada uma das sete cidades em análise.
Quando se observa o gráfico há desde logo duas conclusões óbvias:
– A de que os valores das casas em Portugal cresceram de forma bastante significativa (mais de 40% no espaço de 5 anos);
– A de que os valores das casas no Porto e em Lisboa dispararam. O que parece ter gerado um efeito cascata sobre os concelhos vizinhas de Vila Nova de Gaia e Amadora. Neste último caso, o valor das casas aumentou 107% em cinco anos. Leu bem: 107%.
O que é menos óbvio mas igualmente interessante é que esta mesma variável, medida até seis meses antes (ou seja, até ao 3º trimestre de 2020) indicava um crescimento de 80,0% em Lisboa e de 85,3% no Porto. Ou seja, no espaço de meio ano, os valores em Lisboa caíram ligeiramente (-2,3%), enquanto que no Porto continuaram a evoluir a um ritmo impressionante (10.8%).
É igualmente interessante constatar que os valores de Porto e Coimbra eram praticamente iguais até ao 2º trimestre de 2017. E como menos de quatro anos depois, o m2 no Porto custa mais 60,8% que em Coimbra. O Porto vem-se afirmando, ano após ano, como uma marca internacional e isso tem um impacto muito significativo na procura de habitação.
Nota importante: O Instituto Nacional de Estatística (INE) apresenta uma ferramenta incrível que lhe dá – para cada uma destas sete cidades – os valores medianos por m2 a que as casas são transacionadas numa freguesia, em quadrículas com 500m de lado, e em pequenas secções estatísticas que, por vezes, não perfazem mais que dois ou três quarteirões.
por Michele
CONCELHOS DA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA
A Tabela 1 [os valores a vermelho representam descidas em relação ao trimestre anterior, os valores a bold os máximos registados naquele município durante todo o período em análise] demonstra que o valor das habitações na Área Metropolitana de Lisboa (AML) tem subido de forma constante desde 2018. Os concelhos de Almada, Moita, Seixal, Setúbal, Barreiro e Sintra registaram subidas superiores a 50% durante este período, e a variação do preço das casas na Amadora ultrapassou os 60%. De salientar que, à excepção do município da capital, todos os outros concelhos registaram máximos históricos no último trimestre em análise.
por anyaivanova
FREGUESIAS DA CIDADE DE LISBOA
A Tabela 2 [os valores a vermelho representam descidas em relação ao trimestre anterior, os valores a bold os máximos registados naquela freguesia durante todo o período em análise] mostra algo que não deixa de ser uma nova realidade: os preços em Lisboa registaram pequenas descidas em 2020.
Porque é que digo 2020 quando já temos dados de 2021? Os valores de transação são registados pelo INE em função do momento da transação, cuja oficialização é feita por ocasião do contrato definitivo de compra e venda, mais conhecido por escritura. O que sucede é o seguinte: grande parte das transações imobiliárias em Portugal são precedidas de contratos promessa – celebrados usualmente 30/60/90 dias antes da contrato definitivo – nos quais o valor de transação é fixo e é pago um sinal que, na maior parte das vezes, ronda entre os 10% e os 20%. O que é que isto significa? Que os valores de transação apresentados nos estudos tendem a projetar os preços negociados, contratados e sinalizados no trimestre imediatamente anterior.
Note por exemplo, que os "trimestres mais vermelhos" do período em análise são o 3º trimestre de 2020 e o 1º trimestre de 2021. Recordo que o primeiro confinamento ocorreu no 2º trimestre de 2020 e que o regresso das restrições começou a fazer-se notar nos últimos meses de 2020 (talvez não se recorde mas apenas no final de Outubro é que o uso de máscaras em espaços públicos se tornou obrigatório em Portugal, e foi no início de Novembro que foi decretado recolher obrigatório nos concelhos mais afectados, Lisboa incluída). Assumindo esta mesma lógica, e sabendo nós agora que o 1º trimestre de 2021 trouxe um segundo confinamento total, é possível que o 2º trimestre não apresente muitas freguesias com novos valores máximos.
Por outro lado, deve ter-se presente que no 4º trimestre de 2020 (que terá refletido essencialmente o que se passou no 3º trimestre, ou seja, no Verão do ano passado), em pleno contexto pandémico, se bateu o recorde de número de transações num único trimestre. O que sugere que, atenuadas drasticamente as restrições, o número de transações pode disparar, e pressionar novamente os preços em sentido ascendente.
Importa lembrar que o valor de um dado ativo é afetado diretamente pela procura existente. Quando somos obrigados a ficar em casa (e recordo que as visitas físicas de imóveis afetas à mediação imobiliária estiveram proibidas entre 15 de Janeiro e 15 de Março) é normal que aconteçam menos visitas, menos propostas e menos negócios. Sendo que, no caso de Lisboa, é do conhecimento generalizado que os valores de mercado cresceram muito à boleia da procura estrangeira, a qual esteve drasticamente limitada até há bem pouco tempo, quando as regras de circulação entre países – nomeadamente através da utilização mais generalizada do passaporte digital – começaram a ficar mais claras. Dito isto, e recorrendo ao exemplo mais óbvio (o Brasil tem, de longe, a maior comunidade estrangeira residente em território nacional), ainda hoje não é fácil para um cidadão brasileiro entrar em Portugal vindo do seu país natal.
por trabantos
CONCELHOS DA ÁREA METROPOLITANA DO PORTO
Quero começar por dizer que não estou familiarizado com as dinâmicas da Área Metropolitana do Porto (AMP). Mas a verdade é que tive a oportunidade de assistir, in loco, às mudanças ocorridas nos últimos dez anos, no centro daquela cidade. É por isso fácil de imaginar que as consequências para lá dos limites da cidade (a procura de alternativas ao centro do Porto, na sua periferia mais próxima, em busca de soluções habitacionais mais equilibradas face aos rendimentos das famílias), se assemelhem muito ao que assistimos na Grande Lisboa. De resto, os preços da habitação (e pelo menos até à crise pandémica, o impacto que o alojamento local terá tido nos centros históricos), têm sido motivo de um extenso debate ideológico e político, nas duas metrópoles nacionais.
Quando olhamos para a Tabela 3 [os valores a vermelho representam descidas em relação ao trimestre anterior, os valores a bold os máximos registados naquele município durante todo o período em análise] constatamos algo que já havíamos visto na AML: concelhos vizinhos com boas acessibilidades ao centro do Porto (e estou a pensar em Matosinhos, Gondomar e Vila Nova de Gaia) apresentam valorizações do preços por metro quadrado superiores a 50% num espaço de 3 anos. O que não deixa de ser um paralelismo evidente com aquilo que assistimos, mais a sul, em Odivelas, Amadora ou Almada. Destaque-se também que foi município de Valongo aquele que registou a maior subida de preços por metro quadrado (56,3%).
por rh2010
FREGUESIAS DA CIDADE DO PORTO
Como já tinha sido referido na leitura do gráfico inicial, a evolução dos valores de transação em Lisboa e Porto apresentaram comportamentos diferentes nos últimos trimestres. Como se compreende pela leitura da Tabela 4 [os valores a vermelho representam descidas em relação ao trimestre anterior, os valores a bold os máximos registados naquela freguesia durante todo o período em análise], a cidade invicta, a contrário da capital, tem continuado a apresentar subidas dos valores de transação por metro quadrado. As exceções até agora foram, no último trimestre apurado, duas das três Uniões de Freguesias (UF) onde os valores por metro quadrado são mais elevados: UF de Aldoar Foz do Douro e Nevogilde (que como o nome sugere, inclui a famosa zona da Foz), e UF de Lordelo e Massarelos (alberga o Bairro Gomes da Costa, Serralves, Campo Alegre, Bom Sucesso, Galiza, e grande parte da faixa ribeirinha que há entre a Foz e Miragaia).
Já a UF de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória (a outra área onde se praticam valores mais elevados, e onde está localizado o centro histórico da cidade) vem apresentando valores consecutivamente crescentes desde o 3º trimestre de 2019. Admito que a reabilitação urbana do centro histórico seja a grande responsável por esta pressão sobre os preços. Segundo o portal Idealista (a 30 de Agosto de 2021), 592 de um total de 1013 prédios à venda na cidade do Porto, estão localizados nesta UF. De resto, estima-se que a maior pressão residencial sobre o Porto tenha começado a exercer-se com pelo menos um ano de delay em relação a Lisboa. O que poderá ajudar a justificar o vincado ritmo ascendente de preços que a segunda cidade do país ainda conserva.
Resta chamar a atenção para Campanhã e Bonfim, as freguesias portuenses onde a evolução do preço/m2 foi mais significativa nos últimos três anos (108% e 79% respetivamente). Para quem conhece bem o Porto, é fácil imaginar que, à medida que os preços na zona histórica disparavam, o interesse pelas vizinhas a Este (isto é, para interior, no sentido contrário à foz do Rio Douro) tenha aumentado. Afinal de contas... quantas ruelas entre os Aliados e a Estação de Campanhã, consideradas decadentes há meia dúzia de anos (e estou a pensar em algumas zonas nas imediações do Jardim de São Lázaro ou do Campo 24 de Agosto), não são agora os novos “places to be”?
CONCELHOS DAS CAPITAIS DE DISTRITO E DAS SEDES DOS GOVERNOS REGIONAIS DOS AÇORES E DA MADEIRA
A importância da demografia
A demografia é, simultaneamente, o fator com mais impacto na valorização do edificado residencial, e aquele sobre o qual menos se fala. A pandemia e os receios sobre os seus efeitos na economia encaminham, quase sempre, o tema da valorização das casas para grandezas de milhares ou milhões de euros. Mas as variáveis mais elementares para perceber o mercado imobiliário, são o número de pessoas que habitam um dado lugar e as que por lá se movimentam.
2021 é ano de censos populacionais em Portugal, um motivo mais para não se ignorar tamanha evidência. Sabe quais são os dez concelhos mais populosos do país? Por ordem decrescente: Lisboa, Sintra, Vila Nova de Gaia, Porto, Cascais, Loures, Braga, Almada, Matosinhos e Oeiras. Destes dez municípios apenas um (Braga) não é parte integrante das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.
Sabe quais as únicas regiões NUTS (Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos) que registaram um crescimento da população nos últimos 10 anos? Lisboa e Algarve.
Agora olhe por favor para o topo da Tabela 5 [os valores a vermelho representam descidas em relação ao trimestre anterior, os valores a bold os máximos registados naquela capital de distrito/sede de governo regional durante todo o período em análise]. O match é por demais evidente, não concorda?
Lisboa e Porto (e respetivas áreas metropolitanas) continuam a exercer um efeito magnético sobre o resto do país. E são, juntamente com o distrito de Faro (ou se, preferir a região do Algarve: estas designações reportam-se exatamente à mesma porção de território), as áreas onde a pressão sobre o preço do imobiliário mais se tem feito notar.
O efeito da procura estrangeira
Não é segredo para ninguém que um dos motivos apontados para o disparar dos valores das casas nas regiões de Lisboa, Porto e Algarve, é a demanda residencial por parte de compradores estrangeiros. Concorde-se ou não com os moldes em que foram levadas a cabo, as mui discutidas restrições ao alojamento local, e ao uso e à localização dos imóveis adquiridos para a elegibilidade aos célebres golden visa, são a face visível dessa tomada de consciência.
Sabe qual é a segunda comunidade estrangeira residente em Portugal? Os cidadãos do Reino Unido. Em 2020 eram mais de 46.000. Praticamente três vezes mais que em 2013. E sabe onde se concentra a esmagadora maioria das (estimadas pela Portuguese Chamber in UK) 60.000 casas destes britânicos? No Algarve.
Os resultados provisórios dos Censos entretanto divulgados são claros: a população residente em Portugal diminuiu nos últimos dez anos. Mas desde 2017 que os saldos migratórios (diferença entre imigrantes e emigrantes) são positivos, um cenário muito diferente daquele a que se assistiu no período da intervenção da Troika em Portugal. E parece ser essencialmente nas zonas do litoral, nomeadamente na AML, AMP e Algarve, que estas pessoas se estabelecem.
Foquemo-nos agora no final da tabela. Será uma coincidência que Portalegre, a capital de distrito com o valor/m2 mais baixo de todo o país seja também, segundo os Censos 2021, simultaneamente a capital de distrito com menos população, e aquela que mais habitantes perdeu nos últimos 10 anos?
Não é.
Aos dias de hoje o mundo sabe que Portugal existe, sabe onde fica, que é seguro (na quarta posição a nível mundial, segundo Global Peace Index), e que tem muitas outras coisas boas para além do clima e da gastronomia. Sabe que há investidores felizes, e conhece também portugueses que se destacaram dos demais, e que muito contribuem para a mediatização deste país (com Cristiano Ronaldo, hiper-destacado, a encabeçar esta lista). O slogan visit Portugal deu lugar, muitas vezes, a uma outra expressão: moving to Portugal. E isso tem um impacto muito significativo nos três distritos cujas capitais encabeçam a Tabela 5. E parece que, aos poucos, se dá um efeito cascata para outras regiões. Mas por enquanto: apenas para algumas...
BREVE NOTA METODOLÓGICA
Todos os dados partilhados neste artigo tiveram como fonte as Estatísticas de Preços da Habitação ao nível local do Instituto Nacional de Estatística (INE), que apresentam desde logo três vantagens de natureza metodológica face a qualquer relatório de preços da habitação em Portugal:
1) Reportam-se aos valores reais de transação e à Área Bruta Privativa que consta na Caderneta Predial do imóvel (assegurando assim informação consistente sobre os preços por metro quadrado), informação apenas possível graças ao protocolo existente com Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que possibilita ao INE o acesso à informação de natureza fiscal;
2) Incluem todas as transações de propriedades em Portugal cuja afetação seja "habitação", cuja área bruta privativa seja superior a 20m2. Só para ter noção o Regulamento Geral das Edificações Urbanas define 35 m2 como a área mínima a considerar numa nova edificação, reconstrução, reparação ou demolição, para um T0.
E imóveis cuja área bruta privativa seja inferior a 600m2. Excluindo-se, desta forma, habitações com características tão particulares, que poderiam enviesar o valor por metro quadrado de uma dada área.
3) Os resultados divulgados para cada trimestre correspondem à informação registada para o trimestre de referência e para os três trimestres anteriores, o que permite mitigar significativamente eventuais efeitos sazonais no comportamento das vendas. No caso concreto do contexto pandémico, terá sentido considerar que as discrepâncias entre trimestres em que as restrições em vigor fossem significativamente diferentes, podem ser ainda mais marcadas e evidentes do que aquilo que os números publicados pelo INE poderão sugerir.
Sobre outros estudos ou índices sobre os preços da habitação em Portugal
O INE também publica estatísticas sobre a avaliação bancária. Mas é importante recordar que:
a) Parte significativa das casas em Portugal não é comprada com recurso a financiamento;
b) as avaliações bancárias são obtidas, na sua esmagadora maioria, pela análise dos valores anunciados das casas que, muitas vezes, não correspondem necessariamente aos preços praticados; isto faz com que, tradicionalmente, os valores da avaliação bancária sejam superiores aos preços reais.
Note-se também que, quando estamos perante um estudo feito por um portal imobiliário, os resultados têm como base o preço pedido (que, na grande maioria das vezes, não corresponde ao valor real de transação). É também mais difícil assegurar que as áreas inseridas são as corretas. De resto, acontece com alguma frequência encontrarmos o mesmo imóvel anunciado num mesmo portal, por preços diferentes e valores de área distintos.
Por outro lado, se o estudo foi feito por uma marca de mediação imobiliária, ela poderá apresentar valores reais de transação, mas apenas daquelas nas quais teve intervenção direta, o que limitará de forma significativa a abrangência do estudo.
Há ainda bancos de dados que têm acesso aos valores de transação que as empresas de mediação afiliadas lhes comunicam. Mas, em todo o caso, ignoram todas as transações asseguradas por particulares ou empresas de mediação com as quais não tenham relação.
Os valores das Estatísticas de Preços da Habitação ao nível local do INE são, na minha opinião e pelos motivos expostos, aqueles que oferecem um retrato mais exaustivo e representativo de todo o universo dos preços da habitação em Portugal.